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07/06/2019
O Brasil é quinto maior produtor mundial de algodão e este ano conquistou o segundo lugar no ranking de maiores exportadores mundiais da pluma. Nesta safra, serão 2,7 milhões de toneladas de pluma produzidas em solo brasileiro, das quais 1,7 milhão de toneladas seguirão para exportação, segundo dados da Conab. Para que esse salto de produção da fibra nacional tenha sustentabilidade, ele precisa estar aliado ao aumento da biodiversidade do sistema de cultivo sob pena de gerar resistência de pragas, doenças e plantas daninhas, causando a perda rápida das tecnologias e elevando os custos de produção. É o que aponta o diagnóstico realizado por pesquisadores e analistas da Embrapa. O documento que faz parte da série Desafios do Agronegócio Brasileiro traz um raio x da situação atual da cadeia produtiva do algodão no Brasil e no mundo e os principais desafios tecnológicos para o crescimento da produção nacional.
Para o chefe-geral da Embrapa Algodão Liv Severino, um dos autores do relatório, as perspectivas da cultura para os próximos anos são promissoras. “Do lado da demanda, a elevação da renda e da população, principalmente na Ásia, e a tendência mundial de consumo de produtos naturais, em substituição aos materiais plásticos sintéticos, impulsionarão o consumo das fibras naturais. Do lado da oferta, o Brasil dispõe de terra e tecnologia para atender ao aumento do consumo mundial de algodão. A qualidade do produto, os avanços nos métodos para controle de pragas e doenças tropicais, a obtenção de variedades mais produtivas, o desenvolvimento de sistemas eficientes de produção e a destacada organização da cadeia produtiva dos produtores brasileiros de algodão são fatores decisivos para a conquista dos mercados nacional e internacional”, avalia.
Segundo o relatório, entre os principais exportadores, o Brasil é o único país que pode crescer em produtividade e em área plantada, assumindo um papel cada vez mais importante no mercado mundial de algodão.
O algodão é quarta cultura mais importante da agricultura brasileira, depois da soja, cana de açúcar e milho. No ano passado, o Valor Bruto da Produção (VBP) foi de R$ 34,95 bilhões, o que representa 9,10% em relação ao VBP das culturas. Nos últimos três anos, a cultura teve um desempenho espetacular, crescendo 131%. Atualmente, a produção da pluma concentra-se em Mato Grosso, com 64% do VBP, e 25% no Oeste da Bahia, totalizando quase 90% do valor recebido pelos produtores. Nos últimos 10 anos, a produtividade média cresceu creca de 20%, atingindo o patamar 1.700 kg/ha nas duas últimas safras.
Desafios tecnológicos da agricultura tropical
Por estar situado em ambiente tropical, o Brasil tem algumas vantagens competitivas em relação às regiões produtoras de ambiente temperado. Uma delas é a possibilidade de explorar economicamente a terra ao longo de todo ano, enquanto nas regiões temperadas a agricultura é pouco significativa na estação fria. Outra vantagem é o ciclo reduzido das culturas que ocorre de forma mais rápida devido às temperaturas elevadas.
Por outro lado, a agricultura tropical possui desafios que não são observados nas regiões temperadas. “A intensidade e a severidade do ataque de pragas, de doenças e de plantas daninhas são muito maiores no ambiente tropical do que no temperado, favorecendo, portanto, nessas condições, as pragas, as quais podem causar perdas econômicas ao produtor”, aponta o relatório.
Com o aumento das pragas, aumenta também o número de aplicações de defensivos, e consequentemente, a resistência de insetos, plantas daninhas e microrganismos. Se um determinado fungicida é utilizado intensamente para controlar uma doença, depois de algum tempo ocorrerá a seleção de indivíduos que conseguem resistir ao fungicida, sendo necessário utilizar um outro produto que possua mecanismo de ação diferente para conseguir controlar a doença. O mesmo acontece com os insetos e plantas daninhas.
“O que estamos descobrindo é que o tempo para desenvolver essa resistência está sendo muito menor nas regiões tropicais do Brasil quando comparado aos países de clima temperado. Casos de resistência levam algumas décadas para serem observados em regiões frias, enquanto que o problema é observado em poucos anos nos sistemas agrícolas tropicais do Brasil. O ritmo rápido de surgimento de populações resistentes aos insumos e às técnicas de manejo disponíveis causam constante aumento dos custos de produção e maior complexidade no sistema de produção. Essa é uma preocupação constante dos agricultores, pois enquanto os custos aumentam a cada ano, os preços dos produtos agrícolas não aumentam de forma proporcional e a rentabilidade da atividade fica ameaçada”, revelam os pesquisadores.
A solução para a sustentabilidade da agricultura brasileira vem de lições dadas pela própria natureza e está sendo construída por meio da busca do aumento da biodiversidade nos sistemas produtivos. “Existe um padrão amplamente conhecido na disciplina de Ecologia chamado ‘Gradiente latitudinal de diversidade’ no qual a diversidade de espécies aumenta de acordo com a latitude, sendo a biodiversidade mínima nos polos e máxima na linha do Equador. Devido a este padrão da natureza, para que um sistema agrícola tenha equilíbrio o número de espécies numa região tropical precisa ser muito maior que num sistema agrícola localizado em latitudes maiores. O modelo de agricultura inicialmente adotado no Brasil foi amplamente copiado de países temperados, tais como Estados Unidos, França e Alemanha. O modelo importado funcionou inicialmente, mas logo que os problemas começaram a surgir, foram sendo desenvolvidas soluções locais que estão permitindo a continuidade dessa atividade”, diz o estudo.
Um dos exemplos mais importantes do aumento da biodiversidade nas lavouras de algodão é a necessidade de rotação de culturas. “Para evitar o aumento incontrolável do uso de agrotóxicos, os produtores de algodão estão sendo forçados a aumentar o número de espécies cultivadas em suas lavouras para manter os sistemas agrícolas equilibrados”.
A rotação de culturas que começou com soja e algodão hoje inclui uma extensa lista de espécies que estão sendo introduzidas nos sistemas agrícolas brasileiros, incluindo crotalária, sorgo, feijões, milheto, mamona, diversas espécies de capim, estilosantes, grão-de-bico, gergelim e muitas outras.
Outro exemplo de aumento da biodiversidade nas lavouras brasileiras de produção de algodão é o controle biológico, que consiste em utilizar outras espécies que tenham a capacidade de reduzir os danos causados pelas pragas. Por exemplo, vespas que colocam os ovos dentro das lagartas e provocam a sua morte, ou fungos e vírus que causam doenças nos insetos.
“A adoção do controle biológico é defendida há décadas como a opção menos impactante para o meio ambiente e mais sustentável em longo prazo. No entanto, a sua adoção é limitada porque utilizar produtos biológicos é muito mais complexo do que os produtos químicos tradicionais. Mas apesar das dificuldades, está havendo crescente aceitação do uso de controle biológico como a principal opção para manter a sustentabilidade da produção de algodão no Brasil. Estão surgindo exemplos em escala comercial de fungos para controle de nematoides de solo, bactérias para manejo de insetos e vespas ou vírus utilizados no controle de lagartas, entre outros”, pontua o documento.
Ameaças e soluções para o algodão
Entre as maiores ameaças atuais à produção de algodão estão o bicudo do algodoeiro, a ramulária e os nematoides. O documento traz medidas que estão sendo tomadas pela pesquisa para solucionar os problemas.
O bicudo é a principal praga do algodoeiro e encontra-se na América do Sul. De acordo com o relatório, o desenvolvimento de tecnologias para seu manejo precisa ser liderado pelo Brasil, pois a praga não é prioridade nos demais continentes. “O manejo do bicudo tem sido feito com uso intenso de inseticidas químicos e é uma fonte de preocupação, pois estão surgindo populações do inseto resistentes aos inseticidas disponíveis, aumentando os custos de produção e comprometendo a viabilidade da produção.”
Entre as medidas que estão sendo tomadas para convivência com a praga destacam-se a destruição dos restos das plantas de algodão logo após a colheita. Também é preciso ter cuidado com as plantas que nascem dentro das lavouras seguintes e nas margens das estradas. “Se esse controle for feito com rigor, poucos insetos conseguem sobreviver de um ano para outro e a intensidade de ataque da praga se mantém em níveis baixos.”
Uma segunda solução para o bicudo está sendo construída por meio de uma Parceria Público Privada entre a Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa), o Instituto Matogrossense do Algodão (IMAmt) e a Embrapa. Está sendo desenvolvida uma variedade transgênica resistente ao bicudo. A previsão é que esta variedade esteja disponível em 10 anos.
Outra linha de atuação é o controle biológico do bicudo. “Já se conhecem algumas espécies de insetos (parasitoides) que atacam as larvas do bicudo e poderiam ser utilizadas para o manejo da praga. No entanto, a adoção dessa tecnologia em produção comercial ainda exige grandes avanços tecnológicos como métodos para a produção dos parasitoides em larga escala e com custo aceitáveis”. Mas esta solução precisa ser associada ao controle biológico de outras pragas pois se for necessário fazer uma aplicação de inseticidas para as outras pragas, o parasitoide liberado para controlar o bicudo seria também atingido, eliminando o seu efeito.
A mancha de ramulária é a principal doença foliar do algodoeiro e, se não for controlada adequadamente, provoca perdas econômicas ao produtor. Entre as principais medidas de controle destacam-se os fungicidas e o uso de cultivares resistentes obtidas pelo melhoramento genético. Antevendo que a doença causaria problemas no futuro, a Embrapa iniciou a seleção de cultivares de algodão resistentes à ramulária há cerca de dez anos e atualmente já está disponibilizando aos produtores variedades com resistência ao fungo que provoca a ramulária.
Vários nematoides atacam o algodoeiro causando danos que podem significar perdas expressivas à produção. Esses vermes microscópicos se alimentam, principalmente, das raízes, causando diversas alterações nas plantas. “Recomenda-se utilizar a técnica de rotação de culturas para minimizar o problema, mas também é preciso diagnósticos precisos e orientação técnica adequada, pois cada espécie vegetal escolhida pode ser suscetível a um determinado nematoide e tolerante a outros. Por isso, é preciso escolher com exatidão qual a espécie vegetal a ser utilizada na rotação de culturas para que o resultado da técnica seja satisfatório.”
A Embrapa também está desenvolvendo variedades de algodão resistentes a nematoides e testando combinações de culturas que possibilitem o seu manejo com a adoção de espécies que ofereçam rentabilidade ao produtor e proteção ao solo.
Contribuíram com a elaboração do diagnóstico os pesquisadores Liv Soares Severino, Sandra Maria Morais Rodrigues, Luiz Gonzaga Chitarra e Elisio Contini e os analistas Joaquim Lima Filho, Mierson Mota, Renner Marra e Adalberto Araújo.
Fonte: Embrapa Algodão
Fonte: Fonte: Embrapa Algodão