Daqui a algum tempo, a tributação dos veículos deixará de ser feita com base na capacidade cúbica dos motores e passará a privilegiar os que poluem menos
19/03/2024
Recentes anúncios de investimentos de várias montadoras, totalizando R$ 66 bilhões só em 2024 e R$ 117 bilhões desde 2021, com direito a pelo menos 30 veículos inéditos a serem produzidos no Brasil nos próximos anos, indicam que os carros híbridos a etanol (ou híbridos flex) tendem a guiar a pesquisa e o desenvolvimento da indústria automobilística no Brasil daqui em diante.
Além do profundo conhecimento já acumulado com o uso do etanol, pesam as recentes experiências com outros biocombustíveis. No início de fevereiro, a Volkswagen revelou o plano de investir R$ 9 bilhões no período de 2024 a 2028. Os recursos serão destinados, em grande parte, ao desenvolvimento de uma nova plataforma, especialmente concebida para carros híbridos que poderão ser abastecidos com etanol.
No fim do mesmo mês, o presidente mundial da Hyundai, Eui-sun Chung, anunciou o aporte de US$ 1,1 bilhão (cerca de R$ 5,5 bilhões) para desenvolver veículos eletrificados no país. Mais recentemente, a Stellantis também declarou que investirá R$ 30 bilhões em 40 novos produtos no mercado brasileiro, boa parte deles híbrida.
Em recente entrevista ao Valor, o presidente mundial da Scania, Christian Levi, mostrou entusiasmo com o avanço do uso de resíduos agrícolas para a produção de biocombustíveis no Brasil. O executivo disse, ainda, que o tema tem despertado interesse dos países do sul da Europa e foi um dos assuntos abordados nas discussões sobre mudanças climáticas no Fórum Mundial de Davos, em janeiro.
Ao mesmo tempo, a oportunidade de elevar a produção de milho no país estimula a geração de etanol derivado do grão. Soma-se a esse quadro a regulamentação do Mover, programa de incentivos fiscais para o setor automotivo que dá continuidade ao Rota 2030.
Um dos destaques do programa é que, daqui a algum tempo, a tributação dos veículos deixará de ser feita com base na capacidade cúbica dos motores e passará a privilegiar os que poluem menos. Quanto menores os índices de emissão de um veículo, menores os índices de impostos que ele pagará.
Daqui a dois anos, o cálculo englobará o que o setor chama de “do poço à roda”, que significa incluir gases emitidos desde o processo de extração do combustível — no caso do petróleo — ou “do campo à roda” — se for etanol. Nesse esteio, o governo já se movimenta para aumentar o teor de etanol na gasolina e também o de biodiesel no diesel.
Até hoje, o governo brasileiro não fez uma opção clara sobre a política energética para veículos comercializados no país. Todos concordam que o Poder Público não poderia se dar ao luxo de oferecer bônus para compra de carro elétrico, como fizeram países da Europa e os Estados Unidos.
Mas, de forma natural, o conhecimento que o país carrega com as décadas de uso de etanol tem indicado um caminho para o Brasil. Carros elétricos também serão sempre bem-vindos, não só porque o país oferece fontes limpas de energia como também pelo poder de sedução desses modelos.
Mesmo que as marcas chinesas tenham anunciado planos de produzir modelos puramente elétricos no Brasil, só o tempo dirá como se desenhará, no futuro, o parque industrial automotivo do país que ocupa o oitavo lugar entre os maiores produtores de veículos do planeta.