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24/08/2022
Por Décio Luiz Gazzoni, Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa e membro fundador do Conselho Científico Agro Sustentável
Nas crises surgem as oportunidades. A crise é representada pela poluição dos plásticos, um dos maiores problemas ambientais do mundo atual. A oportunidade está na criação de insetos que possam degradar os plásticos e auxiliar na sua eliminação.
Os plásticos são parte integrante da economia global e do cotidiano de cada um de nós. A produção global de plástico atingiu 38 Mt em 2021, a qual deverá crescer substancialmente na presente década, enquanto a previsão para as taxas de reciclagem é que permaneçam baixas (bitly.ws/snQZ). Essa falta de reciclagem, aliada à alta durabilidade dos plásticos, tem resultado em uma ampla gama de impactos ambientais negativos (bitly.ws/snR6).
O aumento da poluição produzida pelos plásticos é um grande problema ambiental, e uma maneira de combate-la é adotar uma economia circular, na qual os materiais usados são reciclados. Um passo importante para facilitar esse processo é inventar novas abordagens para a reciclagem de resíduos plásticos em produtos de consumo desejáveis. A degradação e a conversão microbiana do plástico provavelmente desempenharão um papel considerável na construção de uma economia circular, utilizando microrganismos ou suas enzimas para reciclar resíduos plásticos.
Um dos polímeros mais prevalentes em todo o mundo é o poliestireno termoplástico durável (PS), que responde por até 10% da produção total de plástico não-fibra (bitly.ws/snRe). Entre os vários tipos de PS, a espuma é mais amplamente utilizada em produtos de consumo, sendo conhecida como isopor. Como outros plásticos, o PS persiste na natureza por décadas e pode prejudicar a vida selvagem e os seres humanos.
Biodegradação dos plásticos
Um primeiro passo para concretizar este objetivo é identificar micróbios que possam degradar o poliestireno e investigar as enzimas e vias envolvidas. O microbioma dos insetos tem se mostrado particularmente útil para a biodegradação de plásticos. Aí é que reside a oportunidade gerada pela crise. Elencaremos, a seguir, diversos estudos de biodegradação de PS utilizando insetos, na certeza que os estudos iniciais se alastrarão para outros tipos de plásticos.
Até o início do século XXI o PS era considerado recalcitrante a micróbios (bitly.ws/snRu), razão pela qual os estudos de degradação de PS focaram principalmente em processos químicos ou mecânicos. De fato, o alto peso molecular e o caráter hidrofóbico dos polímeros PS os tornam um alvo difícil para a biodegradação, por serem menos suscetíveis à hidrólise, que é a principal via de degradação natural do polímero. Mas os estudos também mostraram que a degradação abiótica inicial do PS (química ou por fragmentação) aumenta a biodisponibilidade do polímero no meio ambiente, criando superfícies ou substâncias mais expostas à biodegradação.
Nas últimas décadas, vários isolados microbianos foram relatados utilizando PS como fonte de carbono, embora em ritmo lento, em taxas que variavam consumos de 0,13 a 7% ao dia. Estudos mostraram que comunidades mistas de microrganismos, encontrados em solos e culturas, conseguiram degradar PS. Igualmente, consórcios microbianos marinhos reduziram efetivamente o peso de filmes PS, sugerindo que eles são capazes de degradar pedaços de PS intemperizados (http://bitly.ws/snRD).
Biodegradação por insetos
As pesquisas envolvendo microbiomas intestinais de insetos estão demonstrando um potencial dos mais promissores para a degradação eficiente do plástico, combinando mecanismos físicos e bioquímicos. O inseto usa a força mecânica de seu aparelho mastigador para quebrar os plásticos em pequenas partículas, facilitando sua biodegradação pela comunidade microbiana no trato digestivo.
Estudos recentes relataram que os microbiomas de insetos são capazes de biodegradar plástico. Duas cepas bacterianas, Enterobacter asburiae YT1 e Bacillus sp. YP1, isoladas do intestino de larvas da traça-indiana-da-farinha, Plodia interpunctella, foram capazes de degradar polietileno de forma eficiente (bitly.ws/snSN).
O microbioma intestinal de insetos degradadores de plástico mais bem caracterizado é o de larvas da farinha, Tenebrio molitor (bitly.ws/snSW). Suas larvas foram capazes de sobreviver tendo PS como dieta única. Da degradação de moléculas de PS de cadeia longa resultaram metabólitos despolimerizados. A maioria do PS foi convertida em CO2 (47,7%) ou expelido do organismo pelas fezes (49,2%), com apenas uma quantidade limitada (0,5%) sendo incorporada à biomassa do inseto. O gás carbônico pode ser capturado nas câmaras de crescimento de insetos e imobilizado por outras vias. O microbioma intestinal foi considerado essencial para a quebra de PS, pois as larvas da farinha, tratadas com antibióticos, perderam a capacidade de despolimerizar o PS.
Outro estudo, envolvendo uma cepa de Exiguobacterium sp. isolada de um intestino de larva-da-farinha, demonstrou a formação de um biofilme no PS e foi capaz de degradar 7,4% do PS durante um período de incubação de 60 dias. Outro estudo, investigando a degradação de PS e plásticos mistos (PE) em T. molitor, obteve taxas de biodegradação comparáveis, envolvendo as bactérias Citrobacter sp. e Kosakonia sp., que estavam associadas à degradação de PE e PS (bitly.ws/snTD.
Super vermes
Super vermes é um nome comum para as larvas do tenébrio-gigante (Zophobas morio), as quais também sobreviveram tendo PS como a única dieta (bitly.ws/snU3). As larvas converteram 36,7% do carbono PS ingerido em CO2. Assim como ocorre com T. molitor, a capacidade de degradação de PS dos super vermes foi inibida pela supressão da microbiota intestinal com antibióticos, enfatizando a importância do microbioma intestinal na degradação de PS.
Cientistas da Universidade de Queensland (Austrália) também relatam a degradação de poliestireno, com o auxílio de bactérias do microbioma intestinal do tenébrio-gigante, com 95% de sobrevivência das mesmas, alimentando-se exclusivamente de PS. O estudo foi muito profundo, sendo a primeira análise metagenômica de um microbioma de insetos associado ao plástico, revelando enorme diversidade de bactérias presentes no intestino dos insetos, e que podem estar associadas com a degradação do OS (bitly.ws/snRK).
Observa-se um avanço entusiasmante na possibilidade de usar insetos para biodegradação de plásticos, aproveitando, também, os produtos dessa degradação. Trata-se de uma oportunidade interessante para empresários que queiram investir na área, desde que políticas públicas apontem claramente para a necessidade de complementar a reciclagem de plásticos que, até o momento, não respondeu à altura ao desafio de solver a poluição causada pelos plásticos, que assola e ameaça o meio ambiente global.
Fonte: Assessoria de Imprensa CCAS - Alfapress Comunicações
Fonte: Assessoria de Imprensa CCAS - Alfapress Comunicações