Estudo da Orbitas, uma iniciativa da organização Climate Advisers, calculou também as oportunidades se o setor se adaptar à transição climática
O setor brasileiro de soja poderá ter perdas financeiras superiores a 60% até 2050 se não adotar medidas para se adaptar às mudanças climáticas — com impactos mais devastadores para agricultores de lugares remotos e com produtividade reduzida. Mas as perdas podem ser menores se forem tomadas medidas mais arrojadas para conter os efeitos do aquecimento global.
As estimativas fazem parte de um relatório elaborado pela Orbitas, uma iniciativa da Climate Advisers, organização com sede em Washington (EUA), especializada em cooperação climática, e divulgado hoje globalmente.
De acordo com o relatório, entre os desafios que o setor pode enfrentar até 2050 estão uma queda de 15% nos preços da soja, redução de 11% das áreas agrícolas disponíveis e queda na demanda global de 3%. Mas o setor poderá ter melhora de 88% dos investimentos, aumento de 14% no rendimento por hectare de soja, entre outras vantagens, se adotar ações de adaptação à transição climática. A soja também pode ter aumento de 14% na demanda global com a sua procura para biocombustíveis.
“O Brasil pode ter ganhos na transição climática, mas precisa criar condições para reduzir os efeitos do aquecimento global. Grande parte do setor agropecuário ainda subestima os riscos das mudanças climáticas”, afirmou Alexandre Korbele, pesquisador sênior da Orbitas.
Adotar menos medidas expõe os produtores a riscos maiores de perdas. “Trata-se de um cenário de crescentes impactos devido ao aumento de temperatura. Os eventos extremos são muito imprevisíveis e difíceis de modelar, por isso, o cenário traçado no estudo é bem conservador nesse sentido”, afirmou Niamh McCarthy, diretora da Orbitas.
O relatório aponta os efeitos no setor se o país adotar medidas para garantir que a temperatura do planeta não suba mais que 1,5ºC até 2050 — meta do Acordo de Paris de 2015 — , e os impactos se trabalhar para um aumento de 2ºC no clima. No caminho menos ambicioso, os preços da soja cairiam 15% até 2050 em comparação a 2020, dificultando a concorrência para produtores com baixa eficiência. A competição por terra aumentaria com políticas de combate ao desmatamento, resultando em queda de 11% na área disponível. O menor consumo de carne bovina também levaria a uma queda de 3% na demanda global por soja.
Produtores com menos acesso à tecnologia, menor produtividade e mais distantes de portos e indústrias podem ter perdas de mais de R$ 3.085 por hectare até 2050 se não se adaptarem. A probabilidade de perdas é de 90%. “Trata-se de um sério problema social e econômico, já que pequenos produtores formam a maioria dos estabelecimentos rurais no país e produzem grande parcela dos alimentos consumidos no país”, disse McCarty.
As fazendas com alto desempenho, por sua vez, podem atingir lucratividade de R$ 3.200 por hectare até 2050, no cenário mais ambicioso de mudanças para conter o aquecimento global.
A Orbitas cita tendências que demandam atenção. Uma delas é a precificação das emissões de gases de efeito estufa, que podem aumentar os custos de produção dos sojicultores. O setor tem emissões intensivas com desmatamento, uso de combustível para transporte e uso de óxido nitroso como fertilizante. O aumento nos preços podem variar de R$ 435 a R$ 765 por tonelada equivalente de CO2.
Outra tendência é de redução de terras agrícolas disponíveis em até 36% entre 2020 e 2050, com restrições adotadas para conservação de biomas. Outra tendência é a necessidade de investir mais para aumentar a eficiência da produção. Os gastos agrícolas devem aumentar entre 88% a 133% até 2050, dependendo das medidas adotadas.
Em relação ao consumo, uma redução do consumo per capita de carne bovina de até 52%, em um cenário de mudança social mais profunda, poderia causar uma queda de 4% na demanda global por soja. Em um cenário sem mudanças, o consumo de soja aumentaria 38%.
Ainda de acordo com o estudo, a exportação de soja brasileira pode crescer 32% até 2050, se avançar na produção livre de desmatamento, de baixa emissão e alto rendimento.